Doenças como síndrome do pânico, lesão por esforço repetitivo e
até infecção urinária foram constatadas pelo Ministério do Trabalho em
terceirizada. Centrais só seguem operando graças a liminar obtida na justiça
Situação a qual os trabalhadores de telemarketing são sujeitos
A partir de então, um gerente faz a
ronda, ditando ordens em voz alta. E há a ronda virtual: cada palavra dita aos
clientes é gravada para que a equipe de escuta possa checar se o funcionário
seguiu o script da empresa – e se o fez com um “sorriso na voz”. Se estiver num
dia triste, perde bônus.
As ligações entram continuamente pelo
fone de ouvido, só param nos intervalos determinados pela empresa: 20 minutos
para o almoço e dois intervalos de 10 minutos para o banheiro ou água. No caso
de um chamado da natureza, um cronômetro marca o tempo que o funcionário leva
para atender a urgência fisiológica. Para não perder o bônus, alguns preferem
trabalhar de fralda geriátrica.
Além de perder um complemento
importante ao salário, quem não segue cada uma das regras acima pode levar
bronca do supervisor e corre o risco de entrar no que a empresa chama de “linha
de corte”: um limbo que antecede a demissão por justa causa. Uma vez na linha
de corte, cada deslize vira advertência ou suspensão. A maior aspiração dos
funcionários é conquistar o que chamam de “degrau da rua”: a demissão sem justa
causa.
Esse é a rotina dos atendentes da
empresa de telemarketing Contax, onde ficam as principais centrais de
teleatendimento do Bradesco, Citibank, Itaú, Santander, Net, Oi e Vivo. A
descrição acima foi baseada nos registros feitos pelo Ministério do
Trabalho durante mega fiscalização em 2014, quando unidades da Contax em sete
estados foram inspecionadas. O órgão considerou a terceirização ilícita e
responsabilizou os bancos e empresas de telefonia por um conjunto de infrações
de trabalhistas que somaram R$ 300 milhões em multas e R$ 1,5 bilhão em débitos
salariais.
Apesar das exigências para que
corrigissem as infrações, em janeiro desse ano os auditores voltaram a
encontrar os mesmos problemas nas centrais de atendimento do Itaú,
Bradesco e OI – todas sediadas na Contax de Recife, Pernambuco. Essas
centrais foram interditadas em 21 de janeiro por não atender a mudanças
como, por exemplo, parar de constranger o trabalhador a não usar o banheiro.
Além de contabilizar diversos casos de adoecimento, os auditores entenderam que
as violações sistemáticas apresentam um risco grave e iminente de
adoecimento para todos os operadores.
Mas as centrais não ficaram muito
tempo de portas fechadas. Um dia depois da interdição, a Contax entrou com um
mandado de segurança e conseguiu uma liminar para voltar a funcionar . Com base
na defesa da empresa, que diz estar implementando as mudanças necessárias, a
14ª vara da Justiça do Trabalho de Pernambuco não só liberou o funcionamento,
como proibiu o Ministério do Trabalho de emitir novas multas.
“Nós continuamos a receber denúncias
dos trabalhadores, mas estamos de mãos atadas”, alerta Cristina Serrano, uma
das auditoras fiscais do trabalho à frente da operação. “A empresa diz que está
tomando providências, mas seus funcionários nos procuram para dizer que
continuam sofrendo os controles excessivos. Recebemos denúncias de funcionários
com infecção urinária, depressão e síndrome do pânico que continuam
trabalhando”.
Para piorar, novos problemas
surgiram. No dia em que voltaram a trabalhar, funcionárias da Contax gravaram
vídeo no celular em que revelam a cor marrom da água disponibilizada no
bebedouro. Uma delas afirma que já pegou uma infecção por conta disso.
Os problemas de saúde foram o
principal fator que motivou a interdição. Só em 2013, essa unidade recebeu mais
de 23.000 atestados de afastamento devido a lesões por esforços repetitivos e
doenças osteomusculares. Os auditores registraram alto índice de problemas
psíquicos e identificaram grande risco para a ocorrência de problemas vocais e
de audição. “São todas doenças resultantes da organização do trabalho:
decorrentes de assédio moral, exigência para que fiquem sentados na mesma
postura por longos períodos, ritmo de digitação acelerado”, diz Odete Reis,
médica e auditora fiscal responsável pela parte de saúde e segurança da
inspeção.
Sobre esses números, a juíza Camila
Augusta Cabral de Vasconcellos, que liberou o funcionamento das centrais,
julgou que “é plenamente possível que, em um contingente de milhares de
trabalhadores, como é o caso da Contax, alguns apresentem enfermidades”. Com um
prédio que abriga 14.000 funcionários, a média anual de atestados por esforço
repetitivo da unidade supera o total de trabalhadores contratados. A
rotatividade é alta. Isso sem contar os atestados por problemas psíquicos, de
voz e de audição. A grande incidência de doenças chama ainda mais atenção
quando se considera que os funcionários são jovens: 83% têm menos 30 anos.
Em recurso na Justiça do trabalho, a
Advocacia Geral da União entrou com mandado para pedir que a empresa feche as
portas enquanto as mudanças não foram comprovadamente implementadas. A
Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Pernambuco também entrou com
um recurso. Os auditores argumentam que a justiça não pode confiar apenas na
boa vontade da empresa. Citam o caso da Bahia, onde a Contax assinou um Termo
de Ajustamento de Conduta em 2007 e, sete anos depois, a fiscalização encontrou
as mesmas irregularidades que já deveriam ter sido corrigidas.
Em nota, a Contax argumentou que é “a maior empregadora do município e a paralisação das suas atividades, com possibilidade de perda dos contratos de prestação dos serviços, acarretará em demissão em massa de mais de 10.000 funcionários, afetando a vida particular de cada um, gerando sofrimento e angústia destes e de seus familiares, bem como a economia da localidade, sem contar com a infinidade de impostos recolhidos”. A empresa conclui o comunicado afirmando que “cumpre toda a legislação trabalhista e as normas específicas para o setor de call center e se mantém aberto ao diálogo com o Ministério do Trabalho e Emprego”.
Veja fonte AQUI .
Na unidade da Contax no Recife, atendentes de telemarketing
fazem questão de falar: assédios, doenças físicas e psicológicas, intervalos
muito curtos para as refeições…
Recife
(PE) – “Pelo amor de deus, pelo que
você mais ama no mundo, não vá ao banheiro”, é o que Gislaine* já ouviu algumas
vezes de sua supervisora em uma das unidades da Contax do Recife (PE), onde
trabalha como atendente de telemarketing da operadora de celular Oi.
Em
geral, o apelo acontece em dias de medição da Agência Nacional de
Telecomunicações (Anatel), uma vez ao mês. Mas as restrições às idas para
satisfazer as necessidades fisiológicas são cotidianas. “Por duas vezes já fiz
xixi nas calças, na rua, porque fiquei segurando durante o dia”, conta a jovem
à Repórter Brasil.
Na
Contax, os funcionários têm de cumprir pausas programadas: 20 minutos para as
refeições e dois intervalos de 10 minutos cada. Fora desses horários, as pausas
são consideradas pessoais e, por isso, o trabalhador pode perder parte de seu
salário e até levar suspensões. “A gente é muito perseguida, monitorada, temos
de trabalhar em cima de metas. Não pode ir no banheiro, é como se estivesse
prejudicando a supervisora. A minha disse que eu só poderia ir se estivesse
muito, muito, muito, apertada. ‘Você venha falar comigo e eu vejo se você pode
ir’”.
Em
maio de 2013, a Repórter Brasil acompanhou a
fiscalização da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Pernambuco
(SRTE/PE) nas unidades da Contax no Recife. Em outubro do mesmo ano, a ação se
tornou nacional e culminou, em dezembro de
2014, na autuação de sete empresas de telecomunicações e do setor financeiro
por inúmeras violações trabalhistas. O Ministério do Trabalho e
Emprego (MTE) responsabilizou Oi, Vivo, Santander, Itaú, NET, Citibank e
Bradesco por considerar ilícita a
terceirização dos respectivos serviços de teleatendimento.
O
site Santo Amaro, a maior unidade da empresa na capital pernambucana, chama a
atenção pela imponência. Ocupa metade de um quarteirão no bairro de mesmo nome,
na região central da cidade. Seja pelo lado de fora, seja pelo lado de dentro,
o prédio lembra um shopping center. No interior, escadas rolantes quase sempre
cheias de gente. Cerca de 15 mil trabalhadores se revezam pelos três turnos do
dia. A unidade está aberta 24 horas por dia. As salas são separadas por
divisórias de vidro e cada uma é reservada para uma só empresa. Os operadores
de cada contratante nunca dividem o mesmo espaço. Dentro, um sem-fim de postos
de atendimento enfileirados.
A
circulação é intensa. Ao perceberem a presença dos auditores fiscais do
Ministério do Trabalho, acompanhados de agentes da Polícia Federal, dezenas de
pessoas, em sua grande maioria mulheres jovens, se aproximam. E começam a falar
sem parar sobre os abusos sofridos. A sensação é de que têm muito o que dizer,
mas precisam voltar da pausa programada a qualquer momento. Falam da
impossibilidade de irem ao banheiro quando querem. Uma das jovens, com a
barriga de grávida já bastante proeminente, reclama que sua condição exige
diversas idas ao sanitário. Já se conformou em não ganhar a chamada remuneração
variável por isso. Mesmo assim, sofre assédio de sua supervisora.
Outras
criticam o estabelecimento de metas impossíveis de serem cumpridas, os poucos
minutos que têm para almoçar ou jantar, os xingamentos e gritos que ouvem dos
superiores, os problemas no ouvido, na coluna e nas articulações que adquiriram
por conta do trabalho que fazem. Lembram que os médicos do trabalho contratados
pela Contax são coniventes com a empresa e muitas vezes não fornecem atestado
médico.
Nas
áreas de refeitório, aparelhos de microondas servem para os funcionários
esquentarem suas marmitas, que estavam acondicionadas junto com bolsas e outros
pertences pessoais em pequenos armários de ferro nos corredores. São muito
poucos aparelhos para muita gente, formando filas de espera de cinco a dez
minutos – para um intervalo para refeições de 20 minutos, é bom lembrar.
Gislaine
sofre muito com essa realidade. “Não aguento mais, tenho crises de choro, vivo
angustiada, com medo de ficar doida. Me sinto perseguida, ameaçada”, diz.
“Quando estou em casa choro porque sei que no outro dia vou ter de ir
trabalhar.” Além dos problemas psicológicos, a jovem padece de dores nas
costas. Mas, quando se queixa, a supervisora a chama de mentirosa. “E a empresa
ameaça os médicos. Fui tirar radiografia da coluna, pedi atestado mas o médico
disse que não estava autorizado a fornecê-lo.”
Segundo
Gislaine, as pressões contra ela aumentaram desde que souberam que ela queria
ser demitida. “Quando eles sabem que a gente quer sair eles monitoram mais.
Acho que estão me pressionando para eu mesma me demitir”, diz. A jovem
atendente de telemarketing diz que um dos principais objetivos dos funcionários
que trabalham na Contax é encontrar o que chamam de “degrau da rua”. Ou seja,
ser demitido sem justa causa.
*
Nome fictício para preservar a identidade da entrevistada
** Reportagem atualizada às 17hs de 23/12/2014 para acréscimo de
informações
Veja a fonte AQUI .
Megaoperação do Ministério do Trabalho responsabiliza Oi, Vivo,
Santander, Itaú, NET, Citibank e Bradesco por abusos trabalhistas contra 185
mil pessoas em sete estados
Recife
(PE) e São Paulo (SP) – Não grite com
o operador de telemarketing de seu banco ou operadora de celular. Por mais
que você tenha razão, muito provavelmente ele esteja sofrendo uma pressão
monumental no trabalho. Muito provavelmente ele esteja ficando doente por isso.
Física e psicologicamente.
Oi,
Vivo, Santander, Itaú, NET, Citibank e Bradesco. Essas sete gigantes das
telecomunicações e do setor financeiro superexploram os trabalhadores que
prestam serviços por teleatendimento, diz o Ministério do Trabalho e Emprego
(MTE). Uma megaoperação de quase dois anos de duração e que abrangeu sete
estados brasileiros constatou inúmeros exemplos de abusos trabalhistas contra
nada menos que 185 mil pessoas. Destes, 104 mil trabalhavam para a Oi.
De
abril de 2013 a dezembro de 2014, na primeira ação desse porte, uma equipe de
14 auditores fiscais do trabalho, que contou com a colaboração de outros 36
auditores, investigou as condições de trabalho desses profissionais na Bahia,
Ceará, Minas Gerais, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo.
Analisou contratos, holerites, registros de pontos, entre outros documentos, e
visitou os locais de trabalho.
O
resultado: 932 autos de infração lavrados, R$ 318,6 milhões em multas, R$ 119,7
milhões de dívidas com o FGTS e quase R$ 1,5 bilhão em débitos salariais. (Leia mais
informações aqui, na matéria ‘Para o MTE, teles e bancos são responsáveis por
precarização no telemarketing) A fiscalização, que
teve início em abril de 2013 em Minas Gerais e Pernambuco e se tornou nacional
em outubro do mesmo ano, investigou o período que vai de janeiro de 2012 a
dezembro de 2013. A Repórter Brasil acompanhou
a operação no Recife (PE), em maio do ano passado. (Leia mais
informações aqui, na matéria ‘Pelo amor de deus, não vá ao banheiro’)
A reportagem solicitou
posicionamento das sete empresas responsabilizadas e da Contax.
A SindiTelebrasil, representando a Oi e a Vivo, afirma: “O setor de
telecomunicações adota entendimento do Supremo Tribunal Federal de que a atividade
de telesserviços é uma atividade especializada e, em relação a demandas
administrativas e judiciais, as empresas estudam eventuais medidas cabíveis.”
O
Santander alega que “atua em conformidade com a legislação”.O Bradesco
afirma que “cumpre rigorosamente as normas trabalhistas vigentes”. O Itaú
defende que suas terceirizações são legítimas e respeitam os parâmetros legais
do Tribunal Superior do Trabalho: “Também reforça que exige de seus
fornecedores o estrito cumprimento da legislação trabalhista, e que não tolera práticas
inadequadas, as quais são passíveis de punição nos termos do contrato”.
A
NET diz que obedece a legislação vigente: “A terceirização é lícita,
respeitando a Lei Geral de Telecomunicações. A empresa informa que acompanhará
os autos de infração e apresentará as defesas pertinentes”. Já o Citibank
afirma que “atua em total conformidade com a legislação vigente e irá
apresentar defesa em relação à autuação administrativa”. A Contax não
havia retornado até o fechamento desta reportagem.
Shopping
center de call centers
O ponto em comum entre as sete gigantes acusadas de superexploração leva o nome de Contax, empresa de teleatendimento que se autointitula a líder no setor no país, estando presente em 12 municípios brasileiros. Todos os abusos trabalhistas apurados pelo Ministério do Trabalho e Emprego foram identificados em sedes da companhia. Formalmente, a Contax é contratada pelas teles e bancos para prestar serviços de teleatendimento. A megaoperação de fiscalização trabalhista apontou, no entanto, que na prática ela funciona simplesmente como intermediadora de mão de obra.
O ponto em comum entre as sete gigantes acusadas de superexploração leva o nome de Contax, empresa de teleatendimento que se autointitula a líder no setor no país, estando presente em 12 municípios brasileiros. Todos os abusos trabalhistas apurados pelo Ministério do Trabalho e Emprego foram identificados em sedes da companhia. Formalmente, a Contax é contratada pelas teles e bancos para prestar serviços de teleatendimento. A megaoperação de fiscalização trabalhista apontou, no entanto, que na prática ela funciona simplesmente como intermediadora de mão de obra.
“Durante
a ação descobrimos que dentro da Contax funcionam as centrais de
teleatendimento de várias empresas, separadamente, como um shopping center de
call centers”, explica Cristina Serrano, uma das auditoras fiscais do trabalho
à frente da operação. Ou seja, na avaliação do MTE, os reais empregadores dos
funcionários da Contax são, na verdade, Oi, Vivo, NET, Itaú, Bradesco,
Santander e Citibank. “Entendemos que a Contax é uma intermediária da
contratação e também da forma de organização do trabalho intensamente assediadora.
Por isso, decidimos responsabilizar os reais empregadores, beneficiários do
trabalho final”, diz Cristina, da Superintendência Regional do Trabalho e
Emprego de Pernambuco (SRTE/PE), braço do MTE no estado. A terceirização,
portanto, foi considerada ilícita.
As
três teles e quatro bancos são acusados por uma série de violações, como
exercer forte assédio moral, causar adoecimento massivo, manter funcionário sem
registro, pagar um salário menor do que o devido e até impedir ou dificultar a
saída do posto de trabalho para satisfação das necessidades fisiológicas.
“Constatamos assédio moral, adoecimento massivo, sofrimento psíquico. Muitos
trabalhadores sequelados física e/ou emocionalmente. Alguns vivem e trabalham a
base de remédios”, diz a auditora fiscal do trabalho. Segundo ela, a
rotatividade é alta. E a maioria dos funcionários é formada por mulheres entre
18 e 25 anos que estão no primeiro emprego.
‘Miss
Mijona’
A equipe de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego definiu a principal violação sofrida pelos operadores de teleatendimento como assédio moral estrutural pelo método de organização e administração por estresse. Ou seja, o assédio praticado não é caso isolado ou individualizado, mas produto de um método de trabalho baseado na exigência de cumprimento de metas inalcançáveis. “A Norma Regulamentadora [NR] 17, anexo II [do MTE], proíbe o estímulo exacerbado da produção. O supervisor pressiona para bater metas, vender mais, não deixa fazer pausas, controla e limita o tempo para ir ao banheiro em cinco minutos, por exemplo”, explica Cristina Serrano.
A equipe de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego definiu a principal violação sofrida pelos operadores de teleatendimento como assédio moral estrutural pelo método de organização e administração por estresse. Ou seja, o assédio praticado não é caso isolado ou individualizado, mas produto de um método de trabalho baseado na exigência de cumprimento de metas inalcançáveis. “A Norma Regulamentadora [NR] 17, anexo II [do MTE], proíbe o estímulo exacerbado da produção. O supervisor pressiona para bater metas, vender mais, não deixa fazer pausas, controla e limita o tempo para ir ao banheiro em cinco minutos, por exemplo”, explica Cristina Serrano.
Segundo
apurou a fiscalização, os trabalhadores são obrigados a cumprir a chamada
“jornada britânica”, quando se deve entrar, sair e realizar as pausas
pontualmente sempre nos mesmos horários. Juridicamente, os controles de ponto
que apresentam dados invariáveis durante um período de tempo são considerados
fraudados, já que se avalia ser impossível que o empregado cumpra exatamente os
mesmos horários todos os dias. No entanto, caso os operadores de
teleatendimento das sete empresas denunciadas não sigam plenamente a
jornada estabelecida, eles veem descontada o que é conhecida como remuneração
variável.
Os
trabalhadores intermediados pela Contax devem cumprir fielmente nada menos que
oito marcações de horário: entrada e saída, início e fim do período de
refeição, de 20 minutos, e início e fim das duas pausas programadas do dia, de
dez minutos cada. Aquele que deseja receber sua remuneração variável deve
cumprir quase integralmente a “aderência à escala”. Cada empresa estabelece sua
própria meta de aderência necessária para que o funcionário receba a
remuneração, podendo variar de 89% a 95%. No entanto, o percentual de pessoas
que atingem tais metas é baixo.
“A
aderência é 100% se o operador logar e deslogar exatamente nos horários
programados. São oito marcações programadas por dia e não pode ter variação de
nem um minuto para mais ou para menos. Como máquina! Consideramos essa meta de
aderência a mais perversa e desumana, e implica em prejuízo na remuneração, na
avaliação, no uso do banheiro. Essa prática é vedada expressamente pelo anexo
II da NR 17”, diz Cristina.
Muitos
trabalhadores declararam aos auditores fiscais que, para não terem vontade de
ir ao banheiro fora dos períodos programados, evitam beber muita água. Caso
sinta necessidade, fazem de tudo para segurar. Tais práticas acarretam
problemas de saúde como infecção urinária, incontinência, cistite e problemas
nas cordas vocais, já que a atividade exige uso contínuo da fala, e em ambiente
climatizado. Se o funcionário vai ao banheiro mesmo assim, a pausa é
considerada pessoal e ele perde a “aderência”. E caso demore mais de cinco
minutos para voltar, corre o risco até de levar uma suspensão.
As
que mais sofrem com as regras de idas ao banheiro são as grávidas e as que têm
cistite, infecção da bexiga bastante comum entre as mulheres e que torna
constante a vontade de urinar. Uma delas, de tanto usar pausas pessoais por
conta de sua cistite, começou a ser chamada, na frente de todos, de “Miss
Mijona”. A partir de então ela começou a ir trabalhar usando fraldas
geriátricas.
Big
Brother
O monitoramento do trabalho dos atendentes é ostensivo e serve como instrumento de assédio. Os supervisores, coordenadores e gerentes têm uma tela onde podem controlar as pausas de todos os operadores. Um relógio marca o Tempo Médio de Atendimento (TMA), ou seja, quanto tempo cada operador gastou com o cliente. O ideal é que a ligação dure o menos possível. Caso a chamada caia por um problema técnico ou o cliente retorne para tirar dúvidas adicionais, o atendente é que é cobrado por isso. Além disso, as gravações são analisadas para verificar se o operador seguiu corretamente o “script” – roteiro que deve seguir para cada casa – ou se manteve o “sorriso na voz” durante o atendimento.
O monitoramento do trabalho dos atendentes é ostensivo e serve como instrumento de assédio. Os supervisores, coordenadores e gerentes têm uma tela onde podem controlar as pausas de todos os operadores. Um relógio marca o Tempo Médio de Atendimento (TMA), ou seja, quanto tempo cada operador gastou com o cliente. O ideal é que a ligação dure o menos possível. Caso a chamada caia por um problema técnico ou o cliente retorne para tirar dúvidas adicionais, o atendente é que é cobrado por isso. Além disso, as gravações são analisadas para verificar se o operador seguiu corretamente o “script” – roteiro que deve seguir para cada casa – ou se manteve o “sorriso na voz” durante o atendimento.
No
entanto, “o monitoramento não é aleatório”, esclarece a auditora da SRTE/PE. “A
Anatel [Agência Nacional de Telecomunicações] exige que as ligações sejam
gravadas para proteger o direito do consumidor. Mas a empresa usa para outra
finalidade: para perseguir e pressionar principalmente aqueles trabalhadores
com baixa produtividade de vendas.” Segundo ela, um ranking mensal de vendas
avalia o desempenho de cada equipe de 15 a 20 operadores. A lista é dividida em
quatro. O funcionário que permanece no último quartil por dois meses vai para a
“linha de corte”, grupo dos trabalhadores sujeitos a serem demitidos.
“Isso
significa que aumenta a pressão, o monitoramento, o assédio, com punições
abusivas previstas na ‘Escala Pedagógica’, como excesso de pausas pessoais, e
até suspensões por motivos banais, como por usar sandália de dedo ou camisa de
time de futebol. Então esses funcionários são chamados pelo supervisor e
‘orientados’ a pedir demissão para evitar a demissão por justa causa”, diz
Cristina.
De
acordo com a auditora, é uma possibilidade temida por todos, pois muitos estão
no primeiro emprego e acreditam que irão “sujar” suas carteiras de trabalho. “A
rotatividade é enorme e a maioria sai por pedido de demissão ou demissão por
justa causa, formas de extinção do contrato a baixo custo.” Segundo apurou a
fiscalização, uma média de 75% dos trabalhadores que saem o fazem por pedido de
demissão. “Sem justa causa são pouquíssimos os que saem; em geral saem
adoecidos.”
Adoecimento
massivo
Seja por problemas ergonômicos ou decorrentes do uso contínuo da voz e de fones de ouvido, seja por causa da enorme pressão e assédio moral que sofrem, os trabalhadores das sete empresas denunciadas pelo Ministério do Trabalho apresentam inúmeros casos de doenças que podem ser consideradas ocupacionais. “É uma quantidade enorme de pessoas jovens adoecidas”, conta Cristina Serrano. Perda auditiva definitiva, pressão alta, distúrbios osteomusculares, infecções urinária e gastrointestinal, problemas de coluna, cefaleia, estresse, depressão, ansiedade e síndrome do pânico.
Seja por problemas ergonômicos ou decorrentes do uso contínuo da voz e de fones de ouvido, seja por causa da enorme pressão e assédio moral que sofrem, os trabalhadores das sete empresas denunciadas pelo Ministério do Trabalho apresentam inúmeros casos de doenças que podem ser consideradas ocupacionais. “É uma quantidade enorme de pessoas jovens adoecidas”, conta Cristina Serrano. Perda auditiva definitiva, pressão alta, distúrbios osteomusculares, infecções urinária e gastrointestinal, problemas de coluna, cefaleia, estresse, depressão, ansiedade e síndrome do pânico.
A
lista é grande, mas, segundo a equipe de fiscalização, a Contax não reconhece
os riscos da atividade e não toma as medidas preventivas necessárias. Pior: não
comunica o adoecimento por meio da emissão da Comunicação de Acidente de
Trabalho (CAT), medida obrigatória para os casos de lesões ocupacionais. “Ao contrário,
demite os adoecidos.” Além disso, segundo constatou a fiscalização, os
trabalhadores com pequenos problemas de saúde sequer são admitidos, mesmo que
não haja qualquer impedimento ao exercício da atividade.
Segundo
cálculos da equipe de auditores fiscais, o operador de teleatendimento que
trabalha para as sete empresas denunciadas por meio da Contax adoece a partir
de 120 dias no emprego, em média. O Ministério do Trabalho pediu os atestados
médicos concedidos aos trabalhadores da companhia de teleatendimento em todo o
Brasil, mas apenas os de Pernambuco foram fornecidos. “A média é de 6 mil
atestados por mês só em Pernambuco, para um total de 18 mil trabalhadores. Fora
o que os trabalhadores levam e a empresa não aceita. Se o atestado não for do
plano de saúde credenciado pela empresa, não é aceito”, explica Cristina.
De
acordo com dados compilados em uma das unidades da Contax no Recife – site
Santo Amaro, com 15 mil funcionários – por Odete Reis, médica do trabalho que
integra a equipe nacional de fiscalização do MTE, de janeiro a maio de 2014
foram apresentados 8.687 atestados de afastamento do trabalho por doenças
osteomusculares, uma média de 1.737 por mês. Em todo o ano de 2013, foram
23.554 atestados, média de 1.962 mensais. Segundo Odete, dentre essas doenças,
as mais comuns são sinovites, tenossinovites e dorsalgias. Ela lembra que as
duas primeiras, que no caso em em questão acometem os dedos das mãos, inclusive
já são reconhecidas pela Previdência Social como causadas diretamente pela
atividade de teleatendimento.
A
medicina do trabalho para os funcionários da Contax é feita por uma empresa
contratada. Segundo Cristina Serrano, o contrato de prestação de serviços prevê
que se um trabalhador fizer o exame admissional e em até um período de seis
meses apresentar doença e obter um atestado médico, essa empresa será
descontada em sua fatura com a Contax. “É como se fosse uma multa por encontrar
um trabalhador doente. A Contax está presumindo que a empresa errou no exame
admissional.” Muitos operadores disseram à equipe de fiscalização do MTE que
muitas vezes o médico do trabalho afirma não poder fornecer atestado.
Ao
operador, resta continuar a trabalhar mesmo doente e tentar cumprir as metas
estabelecidas sem vacilar. “De um lado da linha, o consumidor, insatisfeito com
o serviço prestado e/ou irritado com a insistência do operador para vender
cartões, seguros, planos de internet, TV, celular, grita, reclama e xinga o
atendente. Do outro lado da linha, o atendente tem que manter ‘sorriso na voz’,
falar com entusiasmo, seguir script de fala, obedecer a todos os procedimentos,
sem demorar na ligação, pois tem meta de Tempo Médio de Atendimento (TMA) e é
vigiado ostensivamente”, resume Cristina.
Não
grite com o operador de telemarketing de seu banco ou operadora de
celular.
* Matéria atualizada às 16h20 de 23/12/2014 para acréscimos de
informações.
Veja a fonte AQUI .
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